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Prescrição de créditos

23-10-2018

Em primeiro lugar, quando falamos de prescrição de dívidas referimo-nos à extinção de um direito em consequência do seu não-exercício, durante determinado período de tempo. No que respeita a dívidas bancárias, a inércia da instituição de crédito em exercer o seu direito de crédito pode de facto determinar a perda do mesmo, caso ultrapasse o respetivo prazo de prescrição.

Apesar de não existir legislação que determine especificamente o prazo de prescrição de créditos bancários, os Tribunais têm vindo a aplicar as normas do Código Civil.

Assim, no que respeita aos créditos à habitação e pessoais, considera-se que as prestações mensais e sucessivas, compostas por capital e juros, prescrevem no prazo de 5 anos a contar da data de vencimento de cada prestação.

Sabendo de antemão que o prazo ordinário é de 20 anos, por que motivo estabelece a lei prazos mais curtos?

Em resposta a esta questão, veja-se o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa no processo nº 1815/2006-1:

“As razões justificativas das prescrições de curto prazo […] do Código Civil são a da proteção da certeza e segurança do tráfico, a conveniência de se evitarem os riscos de uma apreciação judicial a longa distância, […] evitar que o credor deixasse acumular excessivamente os seus créditos, para proteger o devedor da onerosidade excessiva que representaria, muito mais tarde, a exigência do pagamento, procurando-se obstar a situações de ruína económica”.

Em suma, o prazo de prescrição de 5 anos é aplicável às prestações sucessivas e mensais de:

Já as dívidas resultantes da utilização de cartão de crédito, estão sujeitas ao prazo de prescrição de 20 anos.

Este entendimento fundamenta-se essencialmente no seguinte: “O pagamento das quantias correspondentes à utilização do cartão bancário num determinado período, diferido no tempo, traduz o cumprimento de uma única obrigação pecuniária a que cabe aplicar o prazo ordinário de prescrição de 20 anos” (Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, processo nº 183554/14.0YIPRT.C1)

 Em acréscimo, “[…] não estamos perante prestações periodicamente renováveis nem quotas de amortização do capital”. Com efeito, o valor da mensalidade do cartão irá depender da forma de pagamento acordada (integral ou fracionada) e do valor em dívida, que por sua vez depende do grau de utilização dado ao cartão.

Porém, quanto aos juros, continua-se a aplicar o prazo de 5 anos.

Segundo o nosso entendimento, aplica-se igualmente o prazo de prescrição de 20 anos aos valores a descoberto em conta à ordem, aos créditos em conta-corrente e linhas de crédito, uma vez que as características destes produtos se aproximam mais do cartão de crédito do que do crédito pessoal.

Quanto às rendas de leasing, o  Supremo Tribunal de Justiça no Acórdão referente ao processo nº 2843/06.2TVLSB.S1, decidiu aplicar igualmente o prazo de 20 anos.

Contudo, para além da questão dos prazos não ser pacífica nos Tribunais, não é frequente que as instituições de crédito sejam inertes ao ponto de deixar prescrever os créditos, pelo que nos cumpre efetuar alguns alertas:

  • No caso dos créditos pessoais e à habitação, caso o respetivo contrato de mútuo tenha sido resolvido (extinto) por falta de pagamento, tendo o credor exigido o total em dívida, considera-se que a parcela referente a capital passa a estar sujeita ao prazo de 20 anos. Já os juros, mantém-se o entendimento de que estão sujeitos ao prazo de 5 anos (o Tribunal da Relação de Coimbra decidiu neste sentido, no processo nº 525/14.0TBMGR-A.C1);
  • Caso tenha sido citado ou notificado judicialmente, tenha reconhecido/confessado a dívida ou formalizado um acordo de pagamento com o credor, qualquer um desses eventos interrompeu o prazo de prescrição. Nessa eventualidade começa a contar um novo prazo.

Como invocar a prescrição?

A nível de procedimento, a prescrição não é automática, pois necessita de ser invocada pelo consumidor, para produzir os seus efeitos.

A lei não exige qualquer formalidade, mas sugere-se o envio de carta registada com aviso de receção, dirigida à instituição de crédito, manifestando a intenção inequívoca de invocar a prescrição da dívida.

Depois disto, tem o consumidor a faculdade de recusar o cumprimento da prestação, sendo que a dívida deixa de poder ser exigível judicialmente, isto é, o credor deixa de poder cobrar o crédito em Tribunal. Se o fizer, o consumidor terá que opor-se.

Mesmo invocando a prescrição, a DECO já tem verificado casos em que o consumidor permanece com registo de incumprimento no Banco de Portugal (muito embora os Tribunais já tenham considerado essa prática ilícita). Nesse caso, se o credor não proceder à eliminação do registo, o consumidor terá que constituir um advogado ou requerer proteção jurídica à Segurança Social para interpor uma ação judicial contra a instituição de crédito. Na hipótese da dívida não estar prescrita, recomenda-se que tente alcançar um acordo com o credor.

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